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Covid-19 condiciona mercado imobiliário

Na primeira metade do ano, o mercado imobiliário português reflectiu o impacto da pandemia da Covid-19, com a suspensão generalizada dos processos de tomada de decisão a ter uma maior expressividade na actividade ao longo do segundo trimestre, de acordo com a última edição do “Market Update” publicado pela Cushman & Wakefield.

Andreia Almeida, associate e directora de Research & Insight da Cushman & Wakefield, citada em comunicado, refere que “a actual conjuntura abrandou fortemente o crescimento que o mercado imobiliário nacional vinha a registar ao longo dos últimos anos, com a maioria dos operadores ou intervenientes no mercado a adoptar uma atitude cautelosa. Neste contexto, a maior abertura dos proprietários à concessão de incentivos aos arrendatários permitiu uma manutenção dos valores brutos de arrendamento. Por outro lado verificou-se uma correcção em alta das taxas de rentabilidade exigidas pelos investidores institucionais. Para o final do ano, antecipa-se uma quebra generalizada na actividade imobiliária face a 2019, que será particularmente sentida nos sectores actualmente mais afectados, nomeadamente retalho e hotelaria”. 

Escritórios

De acordo com a Cushman & Wakefield, na Grande Lisboa, o volume de absorção no primeiro semestre registou uma quebra homóloga de 23%, a qual foi ainda assim atenuada pela conclusão de algumas transacções de grande dimensão iniciadas no período pré-Covid-19. Com 84.400 metros quadrados (m²) transaccionados, distribuídos por 57 negócios, atingiu-se um novo recorde histórico de área média transaccionada, com 1.480 m².

O Prime CBD (Zona 1) concentrou 26% do volume total, tendo-se registado nesta zona o maior negócio do semestre, o pré-arrendamento de 16.400 m² no Edifício Monumental pelo BPI. O segundo maior negócio consistiu na aquisição pela Cofidis da sua futura sede com 10.400 m² nas Natura Towers, em Outras Zonas (Zona 7). A taxa de desocupação na Grande Lisboa aumentou ligeiramente para os 4,2%.

No Grande Porto, a concretização de transacções que já se encontravam numa fase avançada de negociação no primeiro trimestre contribuiu para uma absorção semestral de 28.400 m², um crescimento de 38% face a 2019. Com 24 negócios, a área média transaccionada aumentou para os 1.180 m², sendo de destacar os arrendamentos pela Concentrix de 5.900 m² e pela PwC de 2.400 m² no recentemente concluído Porto Office Park, localizado no Porto – Boavista (Zona 1), e onde se registou a maior concentração de volume de procura (33%).

Em termos de oferta futura, actualmente estimada para os próximos três anos em 237.000 m² em Lisboa e 70.800 m² no Porto, enfrenta agora um maior risco de correcção em baixa, particularmente pelo potencial adiamento ou mesmo cancelamento de alguns dos projectos previstos.

Com as expectativas de fecho de ano a apontar para uma quebra nos volumes de ocupação, a disponibilidade dos proprietários para a concessão de incentivos adicionais tem aumentado, particularmente através de carência de rendas. Neste contexto, os valores de arrendamento mantiveram-se estáveis, com as rendas prime na Zona 1 nos 23 euros por metro quadrado/mês (€/m²/mês) em Lisboa e €15,5/m²/mês no Porto, uma tendência que se poderá manter dado a preferência pela manutenção das rendas brutas e a actual escassez de oferta de qualidade. 

Retalho

No primeiro semestre de 2020 foram registados pela Cushman & Wakefield cerca de 150 negócios, uma quebra expressiva de 64% face a 2019, a qual foi particularmente sentida durante o segundo trimestre, com apenas 40 aberturas (-82%). O comércio de rua representou 69% da procura, seguido pelos conjuntos comerciais com 18% das novas aberturas. Impulsionado pelo crescimento que o turismo vinha a registar, o sector da Restauração foi o mais activo, com 62% do número de operações, seguido por Outros e Lazer & Cultura, cada um com 10%.

Assente na predisposição de alguns proprietários em conceder incentivos aos seus inquilinos, nomeadamente carência de rendas e/ou contribuições para obras de adaptação, entretanto complementada com a moratória de rendas, os valores brutos de arrendamento mantiveram-se estáveis, com a renda prime no comércio de rua nos €130/m²/mês em Lisboa (Chiado) e nos €75/m²/mês no Porto (Baixa); e nos €105/m²/mês em centros comerciais.Adicionalmente, entrou recentemente em vigor um regime excepcional que suspende o pagamento de rendas fixas nos centros comerciais até ao final do ano, sendo somente devidas pelos inquilinos a renda variável e despesas comuns, aguardando-se detalhes sobre como o mesmo será implementado.

Industrial & Logística

A actividade de ocupação no sector industrial e logístico demonstrou uma ligeira redução da procura no primeiro semestre, com 64.400 m² transaccionados, 9% abaixo do período homólogo. Com 13 negócios, a área média por operação situou-se nos 5.000 m², para o qual contribuíram alguns negócios de dimensão relevante – as ocupações próprias pela Hotelar dos 22.000 m² da renovada Fábrica de Fiação e Tecidos do Rio Vizela (Santo Tirso) e pela Hovione dos 11.400 m² do seu novo edifício em Loures.

Com o aumento do comércio online, a procura de espaços adaptados a este modelo de negócio aumentou, particularmente espaços logísticos nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e plataformas de distribuição de last mile nos seus centros urbanos.

Em termos de projectos futuros, a actual escassez de oferta de espaços de qualidade deverá ser colmatada com a construção de novos projectos, entre os quais se destaca a Plataforma Logística Lisboa Norte (Castanheira do Ribatejo) da Merlin Properties, com uma área total de 225.000 m² e cujo primeiro armazém (45.000 m²) se encontra em construção.

Neste enquadramento, os valores de arrendamento prime mantiveram-se estáveis, com a Zona 1 de Lisboa (Alverca-Azambuja) nos €4,00/m²/mês e do Porto (Maia-Via Norte) nos €3,85/m²/mês.

Investimento

Apesar do impacto negativo da actual conjuntura na actividade de investimento imobiliário, o primeiro semestre de 2020 registou um novo máximo histórico semestral – até Junho foram transaccionados 1.670 milhões de euros em imobiliário comercial (um crescimento homólogo de 50%) distribuídos por 27 operações. Para este resultado contribuiu particularmente a venda de 50% da joint-venture Sierra Prime pela Sonae Sierra e APG à Allianz Real Estate e Elo, por cerca de 800 milhões de euros, e que desta forma compensou a quebra de 88% registada no segundo trimestre, para os 87,5 milhões de euros.

A percentagem de investimento estrangeiro diminui para os 71%, reflectindo praticamente um triplicar do capital nacional face ao mesmo período de 2019, para os €491 milhões. O sector de retalho atraiu 56% do capital investido, seguido por escritórios (21%) e hotelaria (18%). Em escritórios, destaque para a venda do portfolio PREOF pela Finsolutia à Cerberus por um montante entre €150-170 milhões e a recente aquisição (para ocupação própria) das Natura Towers pela Cofidis por 46 milhões de euros.

A previsível quebra na receita operacional dos imóveis e a maior aversão ao risco pelos bancos no financiamento de transacções imobiliárias contribuíram para o abrandamento da actividade de investimento. Com os investidores a procurar retomar gradualmente as negociações, particularmente em logística e escritórios e nos segmentos core e core+, as estimativas de volume total de investimento para o final este ano situam-se na ordem dos 2.500 milhões de euros, o que representaria uma quebra homóloga de 20%.

Neste contexto, as yields prime corrigiram em alta, nomeadamente para os 4,10% em escritórios, 4,25% no comércio de rua, 5,00% em centros comerciais e 6,10% em industrial, reflectindo um aumento entre os 10 e os 25 pontos base face ao trimestre anterior.